Jose Kappel

Sou Forma e Barro

 

Sou forma 
e barro, 
cumbuca aleijada 
de abas tortas; 
que, agora, 
rosco e me esrosco, 
na lembrança dela. 
 
Sou força 
e desalento. 
 
Paramento sem festa, 
dúvida de qualquer sol,
dúbio nos pensamentos !
 
Sou cor virada, sem tom, 
que desabrocha no verão 
sem flores,
sem qualquer espécie
de lado bom.
 
Sou amaciador de pássaros, 
andador de ruas, 
passageiro fugaz 
de avenidas empoeiradas 
de luzes sem  vassalos. 
 
Sou forma 
e desamparo, 
roda de passar, 
gente de ver, 
gosto pra provar, 
vítima ocasional 
da vida que passa. 
 
Sou forma e barro, 
rosco e me enrosco, 
na lembrança dela, 
que dorme vestida 
de esperança em 
algum lugar 
do meu passado, 
que se perdeu 
no tempo 
de minha vida
de lasco, perdida.
 
Hoje, na virada da vida, 
procuro e não acho 
coisas delas. 
 
Partiu, sem sentido, 
pra lugar nenhum, 
lugar que nenhuma aliança 
de amor alcança. 
 
Mas, no fundo, 
rosco que me enrosco, 
sei que partiu, 
pra terra do longe, 
onde sonolentam os ouvidores 
onde sonha minha vida. 
 
E da vida, sei: 
nunca mais vou 
vê-la: 
não tenho contratos 
de sabedoria com 
a paz dos santos. 
 
Não sou mais alvenaria
do espírito,
nem corda
truncada no pescoço
dos lordes.