joaquim cesario de mello

FARELOS DE CALENDÁRIOS

 

Hoje achei um dia que estava perdido

e nem me lembrava mais que tinha vivido

 

Ele foi achado no fundo de uma gaveta

do bagunçado armário da memória

entre tantos outros lascos de dias lembrados

que compõem os anuários da minha história

 

No lugar onde me sustento e me guardo

sou confuso, embaralhado e desorganizado

e em meio aos entulhos das coisas que trago

tem vezes que nem sei direito quem sou ou fui

e no emarando de mim de quando em quando

me desoriento e perdido não me acho

 

Não sou cartesiano nem muito menos linear

me atrapalho até em saber onde deixei

o retrato do dia 28 de abril de 1994

enquanto o ano de 1974 fica acima de 2002

que fica logo depois do dia de ontem

em que passei a tarde tentando lembrar

em que parte de mim foi que deixei

meu vigésimo terceiro aniversário

logo eu que já esqueci o que foi que comi

no almoço do penúltimo domingo passado

 

O dia que finalmente encontrei está esburacado

dele apenas vejo uma fração de minuto

como se o resto fosse dissolvido no ácido do tempo

ou ainda deve estar por aí rasgado em pedaços

misturado a estilhas dos dias que me foram sepultados

no cemitério das ausências e dos esquecimentos

 

No dia da minha autópsia

encontrarão no interior de mim

todos meus carcomidos calendários