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\"Meu pai\" morreu

Eu amava ele. Ele andava de bicicleta comigo nos domingos que a minha mãe pedia. Ele passeava no shopping comigo quando minha mãe não podia. Ele ia nas apresentações de dia dos pais que ele não estava viajando. Ele me levava na fazenda dos meus avós pra ver a família dele. E entre outras coisas que não me lembro. Mas não tem muito tempo que isso aconteceu. Foi antes do divórcio. Um divórcio que deveria ter acontecido há alguns anos. Entre brigas, machucados e choros eles ainda estavam ali, juntos. Mas estavam por mim, pelos meus irmãos. Mesmo que não fizesse bem pra mim- as brigas- estava tudo bem. Afinal, eles estavam juntos. Ele fazia malas. Algumas eram pra viagens. Outras fazendo a promessa de não voltar mais. Depois de um mês, estava lá de volta. E era sempre um alívio. Final de 2018, ou início de 2019? Não lembro. Foram as últimas malas. E com elas, o fim do que parecia um pesadelo. O que eu não imaginava, é que elas indicavam o início de um. A cada vez mais fomos nos vendo menos, conversando menos. Mas agora, a briga era outra. Entre mim e ele. Digamos que não era uma briga de dois. Mas uma briga minha. Eu brigava sozinha. Esqueci de falar, que de acordo com minha mãe, ele é narcizista. Não sabia o que significava, mas depois da separação, ficou cada vez mais evidente. Ele nos buscava pra ir na casa dele, mas pra não ficar feio pra ele. Quando nos buscava, nem conversava com a gente. Então um dia, resolvi falar o que eu estava sentindo. Mas pareceu que ele não entendeu. Então eu tentei de novo. E de novo. Mas ele nunca pedia desculpas. No dia que ele morreu de vez, foi o dia que ele nos levou pra fazenda. Lá eu passei por um turbilhão de emoções. Fui fazer uma caminhada com os meus primos, que nunca tínhamos feito antes. Saímos sem avisar. Nos perdemos no caminho. Aproximadamente uma hora depois, estávamos de volta. Todos tentando entender o que tinha acontecido. Todos eu digo todos os outros pais. O meu? Ah, não sabia onde ele tava. No dia seguinte, fizemos outra caminhada, mas fomos perseguidos por touros de rodeio, e depois um desconhecido passando pela propriedade do meu avô. Depois de uma hora, voltamos. Todos perguntaram o que tinha acontecido. Todos não, porque ele não perguntou. Porquê? Acho que ele não se interessa. No almoço, ele comenta com os irmãos sobre a    namorada. Mas que namorada? Ele me prometeu que não tinha.Todos os inúmeros motivos que apareciam pra eu me afastar do meu pai eu ignorei. Mas esse não. Comecei a refletir sobre tudo, tudo que ele já tinha falado pra me desestabilizar, sobre as vergonhas que eu passo, sobre meu cabelo estar feio. Eu não aguentava mais carregar aquilo tudo dentro de mim. Chegando em casa, eu desmoronei. Contei tudo pra minha mãe. E foi bom finalmente poder falar sobre tudo isso. Aprendi então, que eu só imaginava ter  a figura de um pai, mas o que eu tinha até hoje não consigo explicar. Não sei o que vai acontecer daqui pra frente. Só sei que eu tenho saudade de imaginar ter um pai.