Cecilia

UIARA

                  UIARA

 

Na noite enluarada, cheia de sortilégios,

um homem rema, na sua piroga.

 

Vem de longe uma canção dolente

deslisando, escorrendo

pelo espelho do rio.

 

Já envolto na doçura pegajosa da cantiga,

o homem lembra da Mãe d\'água.

Ela encanta pescadores  

navegando sozinhos, em noites de lua.

 

Uiara canta, em noites claras,

penteando longos cabelos verdes.

Canta, quando sai nuinha da água

e sua pele é mais alva que a lua.

Os seus olhos, de reflexos dourados, 

 seduzem todos, de moleques a velhinhos.

 

O homem sente perigo rondando

mas a canção já lhe circula nas veias

e amolece os ossos.

Salva-se quem foge, para bem longe do rio.

 

O homem sabe.  Mas com toda a força 

do braço impele o barco

no rumo da cantiga, do corpo alvo,

dos cabelos verdes, dos olhos amarelos.

 

Na manhã ensolarada, despida de mistérios, 

no liso do rio deriva uma piroga vazia.