Conheci Seu Mário
na segunda metade do século passado
Ele tinha uma banca de revistas
que ficava no fim da rua da infância
no meio da esquina em que naquela época
para o outro lado eu nunca dobrava
Seu Mário era um homem velho
um pouco mais velho do que hoje sou
de cabelos grisalhos desgrenhados
parecidos com sua eterna camisa
branca, encardida e suada
e tinha um dente postiço de ouro
no lugar do segundo incisivo superior
que em dias de sol sempre brilhava
e ele orgulhoso sorrindo nos mostrava
Nas tardes após os deveres de casa
saía correndo para onde estava Seu Mário
comprava figurinhas de álbum
confeitos, chicletes e bombons
e quando as moedas não davam
ele me deixava ler os gibis de graça
Invejava Seu Mário
que passava os anos cercado
de Tios Patinhas, Mickeys
Bolinhas e Luluzinhas
chupando o adocicado da vida
por detrás daquele dente dourado
(Quando crescer
quero ser como Seu Mário)
Até então não sabia
que as tardes, os meses, os anos
que até os séculos passam
e depois que a esquina do fim da rua me dobrou
eu nunca mais vi Seu Mário
com sua camisa grisalha
a cabeleira toda arruçada
e o dente de ouro na frente estampado
Para onde foi Seu Mário?