Faz muito tempo que não vejo por onde passo,
Pelas sombras que vejo,
No desenho que vai se remoendo,
Tudo é escasso, como a liberdade de um preso.
Mesmo que seja dia
o frio cinzento da madrugada me corta a alma,
Me assusta corrompendo o pouco que sobra
desse meu argumento.
Não luto mais por uma causa justa,
Só pelo que compreendo,
Sendo a felicidade um poço
e o desejo é um balde que cai;
Cada vez que desce se enche de humildade.
Na verdade, viver é tirar algo das profundezas,
Algo que mate a minha sede.
Posso beber das marcas de sangue
na estrada feita com cacos de vidro,
Que avançam em direção as estranhezas.
Durmo racionalmente numa cama de pregos,
Como um faquir,
Ou um poeta a imolar-se em sofrimento.
No fim não sei mesmo quem sou,
O detentor ou o detento, as pedras da construção
ou o templo onde me consolo...
Reviro os olhos pela última vez nessa terra,
Não sou mais tão sedento.
Sou a rocha, e o mar onde me arrebento!
Viro espuma, sou asceta!
Doce e salgado,
O consumo de mim mesmo,
Queimando fatigado no fogo da tocha,
Relativo e agourento como a luz do cometa
que se ilumina perdido universo,
E termina onde começo,
Encontrando-me com sofreguidão,
Riscando o céu que está além de mim com a poesia
escondida dentro do meu pobre coração,
Desejando algo para amar,
Que venha reatar nossos votos de esperança
Sobre o breve pesar dessa vida.
...um ancião índio descreveu, certa vez, os seus conflitos internos:
“Dentro de mim existem dois lobos, um é cruel e mau e o outro é dócil e atencioso. Os dois vivem a brigar”
Quando lhe perguntaram qual dos dois ganharia a briga, o sábio índio parou, refletiu e respondeu:
“Aquele que eu alimentar”