das tantas coisas que eu senti hoje:
no início do dia, remotamente
quase que máquina
de lavar, de passar, de viver, sobreviver
de entrar no onibus, de sair, de dar bom dia e sorrir, de olhar pra janela e sentir
também a dor
nos olhos, nas faces, no corpo e na face do operário.
depois no trabalho senti sono, senti raiva de o sentir, raiva da insônia que me tira tanto do dia
me tira tanto a capacidade
de ir a fundo, deixa meus olhos fundos, cinzentos, embriagados
do amanhã.
depois senti fome enorme
de tanta coisa, tanta vida
senti cansaço de todos esses tipos que conhecemos
mas logo vida me traçou
com as idas e vindas e quase que obrigatoriamente o contratempo me trouxe um sorriso leve, carinho sólido
como uma excessão aos dias cinzas
o estar entre os meus
abraçou minha insônia
sorriu pra minha tristeza
matou minha fome de pertencer
tardou minha ida
por fim, adoçou minha vinda
e vida, miúda e tão grande
depois, como esperado dentro disso, a realidade nua e crua
sufocante e desesperadora.
perder o ônibus foi como água para meus pulmões
o medo, a incerteza, e os instantes que já são horas.
peguei ônibus errado, mas qualquer lugar é errado
sabemos.
fechei os olhos, o peito doía, a garganta ardia, as mãos tremiam.
eu pensava: eu só quero chegar em casa segura\"
quantas pensaram como eu e não tiveram minha mesma sorte
de chegar segura
hj eu só queria que parir, trabalhar, estudar, ir e vir, estar e falar fosse seguro
dentro dessa sistema, muitos não tem vez
mas ainda tenho quem esteja por mim, por nós.
Um dia todas seremos livres e todos nós também seremos.
das garras do estupro, do machismo, do preconceito e do capitalismo.
que marcam qualquer pele
que sangram qualquer ferida
que rasgam qualquer roupa
que dilaceram em qualquer lugar
em qualquer hora
e a hora com o tempo vê a mais pesada clara e salgada Lágrima da Rosa
e lá de cima dos ombros ocoa o grito de cima da grande e maior Rosa, a Luxemburgo.
Socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres
Ainda bem que tenho quem esteja por mim, e estarei de pé e com o punho erguido por todos.