Meus pêsames
o galo morreu
Quem acordará a manhã das madrugadas?
Quem tricotará o novo alvorecer
e o desnudar da escuridade?
Como o Sol saberá a hora de se levantar
e o mundo voltar a despertar?
E se a noite nunca mais for embora
ou se até a luz também acabar?
Que será de nós sem as auroras
e os almoços de meio-dia?
De que serventia terá o horizonte ao mar
se todas as praias ficarem mulatas?
Que acontecerá com o calor dos verões
se nem os corpos serão mais bronzeados?
O que faremos em uma noite assim tão dilatada
cuja boca fechada nos manterá encobertos
detendo os fios das matinadas?
Se à noite todos os gatos são pardos
como saberei distinguir você da sua sombra
sua silhueta da sua alma?
Como enxergarei com quem durmo
se nem mesmo tenho para quem acordar?
Uma madrugada que não termina
jamais será uma noite apressada
e se a claridade nos for proibida
desaparecerei despercebido
tão incógnito como um absoluto nada
As insônias noturnas serão imensas
e todos viveremos sonâmbulos
perambulando por um quarto
do tamanho maior que uma cidade
O galo morreu e nenhum sino dobrou
em que cemitério ele foi sepultado?
...
Mas galos nunca deveriam morrer
e nem pelos vizinhos serem assassinados
pois sem eles os universos seriam
apenas infinitas massas desalumiadas
Quem agora acordará a manhã
depois desta prolongada madrugada?