Encontrei a chave que me leva a um jardim secreto,
Um tanto enferrujada e obsoleta,
Ainda assim tive curiosidade de entrar,
E o que encontrei foram galhos secos e a relva por carpir.
Então decidi plantar uma semente,
E custou para que uma rosa nascesse e desabrochasse,
Decidi não colher nem despetalar,
Ainda assim ela morreu, não se encantou com meus cuidados.
Decidi então semear plantas medicinais,
E a felicidade me foi vendida em cápsulas.
Um dia escalei o muro do jardim,
E ao lado descobri que havia um outro bosque, muito mais rico e encantado, mais colorido,
Aborrotado de flores e frutos.
Alguém trancou o jardim por fora,
E não consigo mais sair dele,
E se eu pular para o bosque vizinho irei morrer na queda,
Então protelo a morte, abandonado nesse jardim sem folhas.
Mas agora posso colher minhas plantas medicinais,
Brincando com a sorte, tentando não colher uma erva daninha e me asfixiar com o veneno.
Mas que seja o veneno,
Carpir e recriar o meu jardim talvez exigiria muito esforço,
Porém agora ele é meu,
E que eu permaneça eternamente trancafiado neste jardim negligenciado.
Ainda tenho algumas sementes,
Eu sei que posso,
Nem que dure uma eternidade,
Apenas acho que mereço ver uma última rosa.
As borboletas vem visitar o meu jardim,
Elas não se importam com a paisagem nefasta,
Elas só querem voar, cumprir com sua natureza,
Mesmo sabendo que viverão apenas vinte e quatro horas,
Elas apenas voam.
As borboletas vem me visitar,
E eu brinco junto com elas,
Vou plantar flores, vou carpir o mato, irei colher os frutos na próxima estação,
E meu jardim será salvo,
Sim, esse jardim será meu.
Quem quer que o tenha abandonado o verá crescer de novo,
Pois a natureza sempre se renova.
Ouço as crianças brincarem no bosque vizinho,
Eu aceito minha solidão,
Pois ao menos tenho as borboletas,
A cada dia novas espécies de borboletas,
De diferentes asas, cores e tamanhos.
Que nascem e morrem diariamente,
Eu brinco de ser boticário,
Sou o mago das plantas,
— Esse jardim será meu, ele já é meu, eu o batizo e ninguém mais irá invadí-lo.
Magnólias, Begônias, Violetas, Antúrios, Plumas-brilhantes, Calêndulas, Ninféias, Astromélias, Gardênias, Petúnias, Margaridas, Girassóis, Tulipas, Amarílis.
São todas minhas, em cada pétala derramo uma lágrima, em cada perfume dissolvo minha mágoa,
Elas me curam,
Elas enfeitam meu leito,
Eu soergo-me ao despertar da primavera.
As abelhas colhem o néctar,
Os esquilos furtam amêndoas,
E logo Pintarroxos pousam nos galhos,
Me fazendo companhia; eles compreendem a beleza das coisas simples.
Eu enxergo o milagre da vida e todas as criaturas,
Eu ouço um sabiá me acordar com seu canto,
E amanheço com os tons da aurora tingindo minha epiderme.
Eu vivo a natureza,
— Eu sou a natureza.