Era uma casa pequenina e bem discreta
Com um jardim a lhe enfeitar a frontaria,
Nela moravam uma avó e sua neta
E mais o amor que entre as duas existia!
Velha viúva e que tanto já sofrera!
Sobrevivendo e resistindo à amargura
Uma mulher à quem a vida traiçoeira
Foi pouco alegre e intensamente dura!
Que viu a morte um a um levar os seus;
Que se humilhou e que por vezes foi cuspida
Dessas mulheres que auferem inda em vida
Pelo martírio, um altar aos pés de Deus!
Sua filha a pouco havia falecido
E logo a neta precisou do seu cuidado
Pobre herdeira de um pai desconhecido
E cujo o peito já batia apaixonado!
Pra despistar a dor que lhe atacava
A pobre velha com assaz delicadeza
Por longas horas piamente tricotava
E deste modo se olvidava da tristeza!
Mas em meio a harmonia do ambiente
Por vergonha ou quem sabe até por medo
Sua neta de maneira inconsequente
Escondia da vovó o seu segredo!
O garoto o qual beijava escondida
a descartou e do amor dela desfez
Lhe dizendo: eu estou já de partida
E é melhor interromper a gravidez!
Uma treva lhe cobriu naquele instante;
Tateava mas não encontrava o chão
humilhada viu naquilo a ultrajante
Cantoria que precede a maldição !
E pensando em sua mãe, desesperada
Para não reescrever infausta sina
A estrutura muito frágil da menina
Perpetrou a decisão bastante errada...
\"A minha doce avó de mim se orgulha
Ela é a Viga,o Amparo e é meu Porto...\"
E pro banheiro carregou aquela agulha
E lá morreu quando tentou um auto aborto!
A velha forte como um cerne de aroeira
Viu-se amuada num silêncio irresoluto
e na clausura de uma angústia sem fronteira
Tricota peças só com linhas cor de luto!