Gustavo Cunha

Ode ao esquecimento

 

A sexta se me chegou com ares de esquecimento, lancinante, inevitavelmente alheia. Os rumores de chuva congelam o tempo num instante que se me penetra com a lentidão agonizante de um dia comprido que tardiamente fenece. O poema teima, não quer vir a ser o que é: 
 
Esquecer é um não querer necessário.
 
Deixar para trás o gozo de momentos vividos;
 
Juras, carícias e tormentos.
 
E a sí se pertencer novamente.
 
 
 
Esquecer é tarefa difícil, árdua, quase impossível...
 
O verbo exige complementação.
 
E o complemento é ausente.
 
Diretamente distantes, sujeito e objeto.
 
 
 
Esquecer é prosseguir, seguir e fluir.
 
Para aonde o coração irá, tal qual uma nau, n’alma o vento soprar,
 
A âncora pesada do destino é quem vai decidir.
 
 
 
O esquecimento é o repouso das lágrimas.
 
Meio termo entre tudo e nada.
 
Transverberação da escuridão.
 
Tempestade que arrefece.
 
O sono do cansaço.
 
 
 
Ele traz consigo as dúvidas sobre o futuro e as certezas do passado.
 
Esquecer é como precipitar-se no abismo:
 
Ficar em sí...
 
Tornar-se sí...
 
E assim, fechando os olhos para tudo o que houve,
 
Eu volto a mim e à vida...