Alguém plantou uma eucaristia no campo
Cresceu árvore frondosa
Seiva branca virginal
Frutos suculentos
Folhas macias e sombra pastosa
Fui abrigar-me nos seus pés durante a chuva
O dono do campo me expulsou com chibatadas
Era o curral dos seus cavalos
Cocho dos bezerros e gozo do ego
Ainda sim, continuei visitando-a nas noites
Roubando seus frutos e matando minha fome
Delícia era deitar naqueles galhos
Reclinar a cabeça em seu peito
Experimentar a paz
Mas o caule secou
O sol queimou as folhas
Expremeu os frutos
Findou a sombra
Como que morta, entortou-se
Vi de longe o pranto do dono
Seus cavalos enlouquecidos
Bezerros desesperados e seu ego acabado
Era o fim de uma vida boa
Todavia, da morta recebi uma herança
Restava o último fruto no meu bolso esquerdo
De brilho indescritível, maciez perene
Emanava vida na minha fome
O fruto disse algo
Os ouvidos não entenderam
Meu coração sim
Mesmo sendo noite, entendi a missão
Resolvi deixá-lo secretamente na porta do dono
De manhã desistiu de morrer
E faminto, plantou a nova eucaristia
Continuo visitando-a
Roubando seus frutos
Matando minha fome
Até que seque novamente
E outra vez o último fruto diga:
\"Seja eucaristia!\"