Antonio Luiz

A mão que não quero

estou fadado a ti desde o princípio

sem desejos, nem vãs expectativas

pro encontro das várias despedidas

dia da partida, da despedaçada ida

 

ainda não estou pronto, confesso-te

sinto-me tão moço pra estar contigo

constranger-me-ia o olhar de adubo

logo eu, semeador assim dedicado

 

conheço-te por impiedosa teimosia

pra me buscar, não mudarias o dia

quando vieres, não o faça às quinze

o dom de mártir não veio nos meus

 

quiçá me encontres em sonho bom

queria permanecer de olhos cerrados

se eu não o fizer, façam-no por mim

não quero ver tua cara velha e feia

 

sei da neve que verte de tuas mãos

do frio deixado na carne que tocas

tirem dali, em tempo, meu coração

calejado, enfeitiçado e tão poético

 

alguém veja de novo em cor de mel

eles não mais servirão àquele corpo

pífia bacia acinzentada de lágrimas

da emanação da coisa descarnada

 

asada, em branco, como anjo bom

ou encardida pelos tantos pecados?

partirá daqui de trem ou num avião

de jangada ou noutra embarcação?

 

ateiem fogo às sobras putrefactas

dispersem suas cinzas no Ouvidor

o que de bom espalhei no caminho

nem o fogo nem o gelo queimará