Roberio Motta

Pandeiro Brejeiro

Ê pandeiro véi

Em teu couro

Vi o dedilhar de amores

Vi o mundo

Vi as cores!

 

Eh pandeiro véi

Tu andas sumido

Trocou teu nome

Andas inibido

 

Agora é uma tal de pandemia

Que em teu colo desafia

E hoje com ar da nostalgia

Lembro de tu e das Pradarias

 

Em tua vasta história

Em teu reinado relvado

Sem árvores ou arbustos

Sinto dó do teu calado

 

É na relva inda suada

É na planície inda plana

É dentro de ti a minha Iracema

Que vem a doce calma e serena

 

E tua pele esticada

De alma plena e lavada

Com teu choro de toque final

Tua voz brejeira e marcante

 

Que chega de mansinho

Após a entrada do piano

E tu lá vem devagarinho

Suada melodia com tuas sualhas

 

Te vi e ouvi sob Arcos da Lapa

Ou no bar da eterna Mocinha

Vinhas tu descendo a ladeira

Pedindo passagem, compasso e linha

 

Me rebaixo ao baixo do teu som

Na encosta do teu dedilhado

Fazendo referência ao passado

Clemente e cheio de precondia

 

Meu amigo pandeiro

Compartilhes tua dor

Teu canto de saudade

Mesmo que eu não seja merecedor

 

É tua a derradeira voz

Por vezes mal entendida

De nostalgia e precondia sem algoz

Encostada na cuica desenebida

 

 

E quando voltares a avenida

Ah pandeiro véi

Eu e tu sem medidas

No giro mundo de vidas

 

E os dedos voltar a te dedilhar

Dançando sobre teu sonoro piso

Do couro belo e curtido

Daquele que começa no canto

Meio sem querer

Meio inibido

Vindo mas não esquecido

Manso e quase escondido

 

 

Muito depois do bandolim

Muito depois do cavaquinho

Esperando a nota do violão

Do nobre piano ou do baião

Entras tu pandeiro devagarinho

 

Feito pássaro ao sair do ninho

Feito doce de avó

Feito calor de paixão

Feito homem passarinho

Aprendendo com a desilusão

 

Desesperado pra te escutar

O entrar do teu canto

Doido pra fazer parte do teu suar

Entrar com o bailar do pranto

 

Ah pandeiro véi

Multicores

Desabores

Meus amores!

 

14/05/2020

Estado de Graça do meu Cariri

Roberio Motta

(Em homenagem ao colega Lemme)