Arlindo Nogueira

ME CRIEI NA ROÇA  

Nasci e tive a infância no ventre da roça

Andei na carroça de bois que o pai tinha

Morei em cabanas cobertas com palhas

Ouvindo as gralhas descascando a pinha

Os meus vizinhos viviam em minha casa

No fogão em brasas o sapeco de pinhão

A roça é tão pura que eu jamais esqueço

A noite lá em casa papai rezava o terço

Em volta da mesa todos davam as mãos

 

 Isso tudo termina aos dez anos de idade

Papai foi pra cidade vendeu nossa terra

Ainda carrego saudade daquela colônia

Há um ninho de cegonha naquela tapera

No terreiro da casa nasceram as savanas 

Enfeitadas por buanas lindas borboletas

O chorão plantado por mamãe na horta

Cresceu as suas ramas numa haste torta

Que sobre a taipa do açude são obsoletas

 

 Lembro nossa casa lá em cima da serra

O pai arava a terra com os bois na canga

O murmúrio da sanga descendo a cascata

Os pássaros na mata sob o pé de pitanga

Hoje aqui na cidade tudo é bem diferente

Quem era da roça sente toda a diferença

Falta o queijo de cincho e o leite na tigela

Lembrança de mamãe expiando na janela

Daquela vida cabocla a saudade é imensa

 

Se eu pudesse enfiaria o pé logo na estrada

Lá na minha roça amada queria amanhecer

Ouvir o portão ranger o latido do cachorro

Queria subir o morro donde me viu crescer

Montava em meu cavalo e saia campo fora

Queria sentar no chão naquele pé de cereja

E no domingo cedinho ir rezar lá na igreja

Para do mundo da roça nunca ir embora.