Rafael Marinho

#6 - Não curti seu ato de adoração ao próprio umbigo

Querido amigo,

Hoje é dia 25 de maio e a humanidade nunca deveria ter se aglomerado em cidades.

Não sem antes conhecer o que é um substantivo coletivo.

 

Que um peixe é diferente de um cardume.

Que uma uva é diferente de um cacho.

Que uma pessoa é diferente de uma comunidade.

Porque só assim se tocariam que seus atos de adoração ao próprio umbigo ferem o umbigo dos outros.

 

Tô falando isso porque abriram um espaço aqui perto de casa em plena quarentena.

E eles deram uma festa de vibrar as janelas de madrugada, nos tirando o sono que já custa a vir.

Tenho certeza que seu lema é: \"Vamos curtir a vida encurtando a vida alheia.\"

 

Mas eu sinceramente não entendo o que tanto comemoram.

Talvez seja o recorde diário no número de mortos.

De verdade, não entendo de onde vem o dinheiro pra tanto churrasco.

Talvez eles se aproveitem dos corpos cuja a vida se esvaiu.

 

Desculpe as palavras fortes, só que existem algumas crenças que não dá pra entender.

Como o Papai Noel, a fada do dente, a inexistência do coronavirus.

 

Ah, como meu dedo coça pra apertar os números do disk aglomeração.

Mas sei que é fácil punir uma ação, difícil é corrigir o caráter.

Só queria que entendessem que o direito de um termina onde começa o do outro.

Enfim, querido amigo, descobri que em terra de cegos, quem vê o outro simplesmente não é visto.

Em terra de egos, também.

Por enquanto.

 

Com amor,

Seu amigo