Raphael Nery

Uma voz silenciosa no luar

 

Certa vez, João foi pescar no lago torto

Foram horas tentando

A raiva subia enquanto os peixes desciam

Poderia largar aquele emprego

Mas não, ainda aguardava pescar

 

Anoiteceu e no primeiro canto das corujas

Algo surgiu nas águas

Eram os peixes chegando

João finalmente pescaria!

Que homem de sorte!

 

Entretanto, todas aqueles belezuras não vinham morder a ísca

Esperavam outra coisa, no céu, entre as árvores do horizonte

O pescador fracassado ficou assustado!

Peixes vivos fora d’água?

Sonho! Por favor, que seja um sonho!

 

Desejando assim, ela surgiu

Diversos raios beijavam as folhas das árvores

Como se quisesse abrir caminho

E chegava nas águas

Atingindo em flechas cada peixe

Não morriam, antes reviviam

 

João sentia um calor nos pés

Ele nunca tinha experimentado aquilo

Se quer saia de casa

No máximo ia ao bar, vender os poucos peixes

Dormia cedo e evitava qualquer contato humano

 

Ela surgia ainda mais

Tinha um aspecto glorioso

Luz semelhante ao sol

Mas com a bondosa diferença

De não matar ao olhar

 

Só podia ser divina

Aquilo, que o deixava admirado

E os peixes, apaixonados

 

Depois de algumas horas

João percebeu que a grande donzela se movia

E já começava se esconder nas árvores do outro lado

E se nunca mais a visse?

Sem lembrar de pescar, corria

 

Corria rápido sem atenção no chão

Tropeçando nas raízes de cada árvore

Pisando em seu próprio pé

Fugindo da pescaria ou procurando alguém que fugia

 

E ela o viu correndo

Mas mesmo assim também corria

Parece que não se importava com o coitado

Ambos se olhando e fugindo

Como a escuridão foge da luz

 

João estava muito longe quando parou

Demoraria dias para voltar ao lago torto

Então soluçou um pranto feio

Parecendo bebê esfomeado

Chorou tanto que nem percebeu o tempo passar

Novamente era noite, e a donzela o encarava

 

Quando criou coragem, declamou a beleza daquele luar!

Sei que ela ficou emocionada

Nem apareceu por inteira, acredito que por vergonha

 

Ainda com tudo aquilo, a donzela insistia em ir embora

O canto, grito ou choro de João não eram suficientes

Talvez fosse necessário algo maior, que fizesse-o visto por ela

 

Mas nem as coisas maiores adiantavam…

O miserável faltava perder a vida por ela

E assim, desistiu de tentar

 

A lua, ao contrário, o ama

E todos os dias espera João no lago torto

Confiante de que algum dia

O miserável pescador compreenderá

Sua diferente forma de dizer “amar”

Uma voz silenciosa no luar