tem esse alguém, esse alguém que tenho pavor, esse alguém me torturou
me lembro com clareza de tirarem minhas palavras, de me amarrarem nisso, de me torturarem, de arrancarem minha pele
de comerem minha sanidade e de fumarem meu ser usando minha dor como se fosse nicotina
eu parecia uma boneca, uma tão quão sem vida, me lembro de cortarem minha pele, mas a diferença é que meu corpo de boneca tinha sangue correndo dentro
me lembro de engasgar com minha própria saliva, que parecia mais uma composição de palavras engasgadas, socorros nunca ditos e misericórdia nunca pedida
me lembro de arrancarem minhas unhas porque eu arranhava meu corpo escrevendo um pedido de socorro que nunca foi visto
me lembro de rasparem minhas digitais porque eu as carimbava por aí para ver se alguém me reconhecia
me lembro de drenarem meu sangue porque ele abrigava tanta poesia como células vivas
me lembro de quem foi que me torturou também, foi eu
uma versão de mim que se consumia, uma versão que não quero esquecer, porque eu a venci
eu a superei, e demorei muito tempo para o fazer
sabe a maior batalha que travamos é aquela onde lutamos contra nós mesmos, onde se decide quem vence, onde você decide quem vence
e eu decidi, eu me escolhi, escolhi essa versão que passei a conhecer, essa versão que luta pela ânsia do viver
-a todos aqueles que travam batalhas