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Maria dorta

Um dedo de prosa.

           Estava a toa na tarde mal começada e,atônita, me vi copiando,imitando num frenesi insano,meus autores favoritos. Parecia que alguns_ os mais admirados_ tomavam posse de minha mão,apoderando_ se de minha cabeça e se digladiavam para ter sua vez de me \" usar como cavalo\", tal como fazem os espíritos,tudo para se expressarem!

           Não resisti,consenti,fiquei em temporária beatitude,entregando_ me como Santa Teresa em êxtase,tal como exposta está na Igreja de Santa Maria della Vitória,em Roma!

            Assim,senti Drummond chegando,ele que,de há muito retirara sua pedra do caminho,mostrava_me,airoso, que o mundo,apesar de grande,cabia na sua janela que dava para o mar. Só isso me deixou tão feliz, pois vi ,também ,que o mar é grande,mas cabe  bem na minha cama,assim como \" o  amor cabe no breve espaço de beijar\".

          De repente, lá vem Bandeira! Pega_me pela mão,sem pedir licença e me leva,literalmente consigo para...Pasárgada!. Lá ,ele diz ser amigo do rei. Ah! Sei bem que lá,eu teria  também ,meu paraíso,meu Shangri_ lá pois, iria pra cama com o homem que escolhesse por lá.! Com Bandeira consenti tomar um porre de alegria,abdicando da tristeza. Resolvi,então,jubilante fazer versos como quem chora,ri ou como quem morre.. Deixei minha alma sofrer,sonhar e gozar.

             Ainda eufórica,entrevi uma figura et\'erea,aguardando sua vez. Era Clarice! Sim,a Linspector que esperava, pacientemente,sua vez. Ela me emprestou sua lucidez perigosa,mostrou_ me como somos compostas de urgências e temos uma alma com o peso da luz. Com ela  aprendi a ter a solidão como minha melhor companhia.

           Qual não foi minha surpresa quando,saindo da Tabacaria,Fernando Pessoa,apressado,me diz que foi apanhado em flagrante delitro! E fazendo_ me apologia do vinho me aconselha a...beber e esquecer para,na eterna siesta de não desejar,deixar_ me,bêbada e asceta estar. E saiu_ me a fazer confidências porque diziam que ele, ao escrever, fingia ou mentia e arrematou_ mas todos sabem que o poeta é um fingidor,que finge ser dor, a dor que deveras sente! Por que a surpresa? E meio brincalhão,declarou que simplesmente sentia com a imaginação,não usava o coração. Ora pois!

E, de repente, estremeci como saindo do transe, e me acordei!

 

Maria Dorta. 31_10_2021