Doloroso

Água

Água que cai do céu
Fria, refrescante, pura, incômoda;
Molhando o cansaço e a desesperança,
Perturbando tristes e confusas idéias...
Água que escorre pela rua, sarjetas, a caminho do insondável, 
Nada levando a não ser os sonhos desfeitos... 
Água de particular ruído,
Forte, fraco, cheio, gotejando sobre um metal qualquer;
Embalando o sono, despertando para uma existência afogada em escombros... 
Água para a terra;
Água para as águas;
Água para os homens
Cansados, sonhadores, destroçados... 
Água de cair, de correr, 
De navegar em desejos perdidos 
E que se dissolverão no oceano sem fim da existência. 
Água sobre o corpo
Morna, prazerosa, reconfortante;
Renovando forças, 
Renascendo esperanças... 
Água que leva embora o suor,
Que retira as impurezas e os odores
E conduz à paz do repouso do justo 
E ao delírio dos eleitos... 
Água de bater suave, inofensiva;
Misturada aos perfumes artificiais e adocicados... 
Cabelos, olhos, pele... 
Luz que não ilumina, 
Mas cujo esfíngico brilho revela, 
Porém guarda indecifrável, 
O segredo dos anjos;
A fonte da vida;
O amor não encontrado 
Que veio se esconder 
E se mostrar em sua mais completa exuberância.