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Cecilia

EU, COMIGO

EU,COMIGO

Ah!   O isolamento da pandemia!

Explorei, longa e profundamente, meus arcanos mais secretos.  Recuperei doces e picantes lembranças perdidas nos tempos vazios desperdiçados com ninharias.

Descobri que as circunvoluções do cérebro são minas onde podemos garimpar tesouros antigos, trocados por badulaques, quando foram nossos.

Fiquei sabendo que o coração abriga, nas suas quatro cavidades, grandes emoções, que esquecemos sepultadas na ganga e agora são pepitas cintilando na bateia.

O corpo todo guarda mistérios e recursos.   Um tinido de cristal, uma voz grave, um dobre de sinos, longe, despertam filigranas escondidas nos labirintos dos ouvidos.

A extensa pele tem, tatuadas em seus milhões de células, a memória de toques e pressões, carinhos e afagos, desejos e suspiros.

Aroma de suor recente, cheiro de pão fresco, salsugem do mar, são levados à mente, e às gônadas, por narinas sutis.

E os olhos?   Mesmo míopes, atentos, percebem o amor no aceno de um lenço, no centro carmesim de uma rosa, nas estrofes de poema quase esquecido...

Oh!   Senhor!

Que crueldade tirar-nos, tão cedo, o ardor da juventude, e conservar-nos, até tão tarde, o tormento da saudade!