Miserável
Penso muito, me cobro muito, demasiadamente demasiado
Vou, volto, me deito, revolto, suspirando, gritando…
Tento me desprender, mas estou preso aqui neste pecado
Tento um refúgio pra me esconder, mas estou falhando…
Aquela balsa amarela já não faz tanto sentido assim
Aquele rouxinol cinza não me dá mais bom dia
Apenas recorro a fumaças escuras e a um copo de gim
A tintas no peito, a lágrimas vazias, sem alegria.
Não sou nada, apenas um espírito errante
Buscando algo para alimentar meu ser que morre.
Algo pra colorir o céu que é cinza, escuro, incessante
Incessante, sem cessar, sem sentir nada e que me fode...
Foge… deste insensato lugar, cruel, amargo, horrível
Seu ser grita, eu sei, o meu também se calou de gritar
Á luz deste dia que tornou-se rubro, corrupto infalível,
mas falhando em apenas falhar por tentar lutar.
Dói, eu sei que dói, mas a verdade pode ser dolorida.
A verdade nem sempre é crua, pode vir revestida.
Cada camada sufoca as outras vertentes de viver
Há muito tempo se tentou ser algo sem poder ser.
Olho ali, através da janela enferrujada, a visão entorpecente
Tão psicodélica que não parece ser verdadeira e real
Não foi eu, eu sou cruel, na verdade, sou como a serpente
Mas uma serpente que não morre sem cabeça no final.
Sou uma sombra que tento sufocar, a obscuridade escura
Segurei cada ponta maligna para não desmoronar
Mas tudo está caindo agora, tudo está marcando ranhuras
Cravando em mim cicatrizes que não posso suportar.
As borboletas monarcas não dançam mais sobre o celeiro,
os potros não sorriem com inocência maçante e forjada
Tudo se esconde em uma caverna mortal de falso/verdadeiro
Limitando a uma única visão um mundo de alta escalada.
Quando minhas mãos decidiram aprumar sua realidade contida
Tudo ao redor se fechou em um cerco robotizado e material
Mas, ali estava ele, o alterego açoitando com vara estendida
Queimando, ardente tudo que renasce neste corpo mortal.
Ali me encontro, em um sistema delirante de prazer e dor,
Onde o prazer é deveras passageiro.. apenas passageiros
E a dor encarna, incorpora no profundo sentir do ardor.
Não há meio termo pra uma alma sem pedaços inteiros.
Por isso tento fugir, tento me mascarar com algo sem ser eu
Em um copo cheio, um corpo dolorido, pulmões carbonizados
E diante de uma mente entorpecida, sem encarar o que aconteceu
Inicio o fim da minha vida, sem alegria e com prazeres empurrados.
Rápido, não quero ver, não quero sentir, sem querer consertar
Apenas desejo injetar em minhas veias dopamina para sobreviver
Em meu corpo vazio e tatuado nada há além de feridas sem curar
Sem cura, sem nada, com somente uma bebida pra me levar a esquecer.