Rodrigues de Senna

RUDE VERBUM

Já não me reconheço

na argila de onde vim.

Nem na costela do verbo,

esse,

         que me cravou

na carnadura dos lábios,

essa gramática que assombra.

 

Porém, é ela quem arrasto comigo

atada à língua. É ela

quem me açoita

                              e me assalta,

quem me afronta

e me abrasa

                       em fonemas

que me ruminam.

 

A quem entrego

este pássaro ferido?

E, com ele,

estas mãos sujas de letras?

 

Sou eu os silenciados,

carne

          da própria carne,

osso

         do próprio osso.

 

Por mais que eu sue,

e sangre,

                 e ardendo busque

nas entranhas dos teus verbos

(não o que

há de amargo, mas

o que há

                 de doce)

 

sou para ti, ó palavra,

como se não fosse.