O corpo frio a mercê do bisturi
Na mão do anjo de branco
Buscando encontrar a causa de sua morte
Ele se aproximou do rosto precocemente envelhecido
Delicadamente na horizontal como se estivesse dormindo
- “Chorou no seu leito de morte! ”
Observou a marca na pele do caminho feito pelas lágrimas
Foi então que notou o cheiro do vinho
Que afogou as palavras
Que nunca mais serão pronunciadas
Enclausurando-as na garganta sem vida
Pegou em suas mãos já geladas
Embaixo de suas unhas grafite
Em seus dedos calos e leves cortes provocados pelo papel
Que denunciavam sua habilidade de transcrever sentimentos
- “Era poeta! ”
A lâmina fria e afiada desenha o “Y” no tronco
Abre-se a caixinha de surpresas
Para espanto do médico legista
Era ausente de coração
“- Está conversado em isopor”
Sussurrou a voz amordaçada pela morte
As borboletas que habitavam em seu estomago
Estavam todas mortas
Suas vísceras eram sentimentais
Estavam repletas de versos sem rimas
Removeu seus órgãos e pesou
Dissecou as palavras que haviam ainda ali
Documentando em um último poema como coautor
Carinhosamente o instrumento cirúrgico
Rabiscou uma linha de uma audição a outra
Presenciou os bombardeiros e guerras infinitas
Que domiciliavam a lógica emoção dos pensamentos
Por fim, levantou a pálpebra
Notou que seus olhos sem vida gritavam poesias vivas
Suturou o cadáver e determinou a causa mortis
Asfixia pelos sentimentos que não permitiu-se sentir.
Por Juliana Kisler