Pedro Trajano de Araujo

A garota do Norte

Era madrugada quando ela voltava para casa

Uma esquina a separava do abrigo de seu lar

No silencio da noite o mal estava a acompanhar

Alguns “demônios” transvestidos de humanos

Eles que estavam juntos na mesma festa

Os tipos de bestas que não aceitam rejeição

Verdadeiros íncubos, sem marca na testa

Que chance teria uma garota indefessa

Diante da crueldade de gente que não presta

Morte violenta eminente bem a sua frente

 

O sol quente da manhã de um típico mês de fevereiro

Tentava em vão aquecer aquela pele gelada

De um corpo encontrado nu na caçamba de entulho

Os vizinhos não ouviram nenhum tipo de barulho

Sonhos enterrados de uma caloura de medicina

Marcas de mãos cravada no pescoço da menina

Os olhos estavam abertos e espelhavam medo

Pessoas aglomeravam-se atrás da fita de isolamento

Uma multidão de anônimos sem discernimento

A perícia fazia seu trabalho diante do acontecimento

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 Deixou pais, irmãos e amigos em outro estado

Veio seguir seu sonho, queria ser médica

Passou de primeira em quatro vestibulares

Por querer lugar pacato escolheu esta cidade

Criada na fazenda quis um município pequeno

Ingenuidade achar que aqui não tinha maldade

Ela deveria ter o direito de andar só e sem medo

A menina vinda de longe encontrou a morte

Talvez falta de sorte da garota que veio do Norte

Na verdade, mais uma vítima por recusar o assédio

 

Começara a primeira semana de aula na faculdade

Festas regadas a álcool e outras drogas toda noite

A moça do campo só foi na balada da sexta – feira

Sentiu-se um peixe que trocou o mar por areia

Conversou com alguns colegas da sua turma

 Muitos se quer tinham frequentado alguma aula

Apelidaram ironicamente o espaço acadêmico de jaula

Naquele ambiente foi abordada por um tanto de veteranos

Que não a viam como mulher, mas como presa indefesa

Aquele mundo era tão diferente que a deixou surpresa

 

Ela disse não para vários homens naquela noite

Sua beleza despertou desejos obscuros em muitos

Que estavam ali com uma só jogada marcada

Sair com qualquer uma que aceitasse sua cantada

Ela sentiu -se então como um pedaço de carne

A ser devorada por quem chegasse primeiro

Observou com repúdio aqueles olhares famintos

De alguns homens que achavam que podiam

Ter qualquer mulher para satisfazer suas vontades

Ela teria fugido dali se seguisse seus instintos

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 O laudo da perícia saiu em duas semanas

Morte por asfixia causada por estrangulamento

O médico legista não deixou nenhuma dúvida

A jovem estudante antes de ser assassinada

Durante seus últimos instantes de vida foi estuprada

No corpo da estudante três sêmens encontrados

No cadáver ainda se descobriu outros ferimentos

Para o clínico nenhuma prova foi tão contundente

Como a que foi encontrada dentro da boca da garota

Um indicador esquerdo preso em meios aos dentes

 

Com o laudo em mãos o delegado traçou a investigação

Muitos foram chamados para depor sobre os fatos

Alguns traziam seus inconvenientes advogados caros

Prender aqueles monstros era questão de honra

Dar para a sociedade e familiares uma explicação

Os três indivíduos quando foram presos ficaram surpresos

O mais apavorado era o idiota com o dedo arrancado

Todos estudantes cursando o último ano de medicina

Os guardas narraram a chegada na prisão dos três detentos:

“Choraram em vão ao serem assediados por alguns elementos”. 

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Esse poema tem a ousadia de alertar sobre o estupro, um mal enraizado na nossa sociedade em todos os tecidos sociais. Estupros, assédios, tipos de violência tão presente na vida das mulheres do nosso país.

A garota do Norte, é um poema que narra uma história fictícia, propositalmente não dei a ela nenhuma característica física, nem nome, o objetivo é que ela represente toda mulher que já sofreu este tipo de crueldade. 

 

Pedro Trajano de Araujo

10 de abril de 2021

Penápolis SP