Acusado de devaneio poético, defendi-me bravamente em confissão!
A voz da alma salta-me em palavras escritas, articuladas na sensibilidade crua da cognição.
Não espero clemência, é um julgamento em vão!
Meus versos são como diamantes sem lavras,
surgindo à flor da terra, brotando os sentidos de sonhos, desatando o improvável, decifrando o imponderável...
Em qual delito se encaixaria as ações em letras da fantasia?
Ainda defendo minha liberdade, pois descareço da ilusão; todas as minhas orações guardam a razão na verdade, essa é minha retórica.
Quem em plena consciência desmentiria o sonho?
Quem em insana inconsciência refutaria a livre expressão?
O que proponho é razoável e não creio ter me implicado em nenhuma contravenção.
Quem me acusa, o tirano carrasco, é recluso do próprio grilhão que lhe turva a visão, sem qualquer horizonte a lhe clarear os anseios.
Jamais teria nos braços as montanhas!
Não dormiria em teias de aranhas!
Sequer pensaria em ser passarinho!
Nunca libertaria os rios das margens, ou ampararia as cachoeiras em queda!
Não sorveria em sedução o simples aroma da brisa, em sussurros indecifráveis!
Jamais imaginaria colecionar nuvens de todas as formas, moldadas com zelo pelas mãos dos ventos!
Não escreveria além do tempo e do espaço!
Nem falo do amor cantado em versos ou das paixões que fazem o mundo tremer, dos romances com asas e cometas...
Acho que seria impróprio, pois soaria como ironia, talvez poderia soar como um desrespeito e, também talvez, daria motivos para outro julgamento.
Quem me acusa talvez nem compreenda a luz do próprio pensamento, assim não compreenderia meus motivos, não enxergaria a dimensão da minha vida, pois não há justiça no vocabulário de quem não sonha.
Ainda que as palavras não me faltem, o incauto acusador não às conhece, pois não escuta, não às conhece, pois não às sente, sua densidade lhe entorpece a mente, talvez seja mais vítima a cada acusação e julgamento, talvez sua sina não tenha verso ou estribilho, não tenha luz, não tenha brilho...
O carrasco que me acusa, que me condena e executa, é a semente seca da desilusão que ainda assim rego, como regaria qualquer deserto, em infantil inocência...
Quem me acusa, nunca foi criança...
E na minha eloquência, minha dialética, quero que seja, o acusador, meu próprio deserto que insisto em regar, crente que flores lhe brotarão e do grilhão aferrado lhe nascerá amor, libertando seu discernimento para além do verso, ampliando sua visão ao bom senso poético.
Dessa forma, ele viveria e se surpreenderia brincando nas enxurradas de chuvas de oceano, com corsários de papel e piratas enviando cartas em garrafas aos afetos do mundo, como qualquer um que vê iria fazer em plena consciência.
E do chão faria um caderno dos seus rascunhos para semeadura de encantos, sem julgamentos, em cultivo do milagre e da esperança, garantindo os frutos de toda poesia...
Acusado de devaneio poético, defendi-me bravamente em confissão!