O sol abrasador congelado num céu sem nuvens;
O tempo que voou até aqui, parado num eterno mesmo instante.
O mesmo lugar que mudou tanto...
A velha dor, o novo desconsolo.
As árvores - seres cada vez mais raros - convidam à solidão,
Mas o mundo deteriorou-se tanto,
Que a solidão tornou-se extinta.
Ninguém está sozinho nem em si mesmo...
As portas que se fecham
Não abrirão jamais,
E uma janela aberta é apenas a continuação de uma melancólica rotina.
Ensurdecedor é o murmúrio do silêncio;
Inexplicável o vazio do olhar;
Cruel conhecer os segredos,
Saber das horas...
Se bate em vão um coração,
Por que a crença deve ser cega?
Se toda morte é inevitável,
Por que amar a vida?
No som do dia ecoa o canto do sabiá.
Um sentimento amargo do passado vem novo em folha
Envelhecer todo e qualquer movimento.
Os olhos se calam em palavras cegas
Que saem dos lábios
Esbarrando em quinas vivas,
Tropeçando nas pedras,
Caindo em buracos que o destino plantou.
A tristeza adquire formas concretas,
Chega a arquear um corpo que não morre;
Ganha vida no riso dos eleitos,
Se faz lágrimas nos secos leitos da alma.
Os atores interpretam suas personagens,
Vivem seus patéticos papéis
Como se construíssem a História.
Eles constituem a história
Do que é devorado e engolido pelo destino.
Migalhas e restos que caem de sua boca,
No chão são as infelizes testemunhas
Dessa máquina de devorar...
Seus dejetos são a graxa do mundo.
Deus continua sendo uma massa de gesso
Estática e insensível nos altares das igrejas,
Uma ilusão distante e incompreensível
No cérebro das pessoas,
Massa de células estática e inculta
Que serve apenas de enchimento da cabeça.
Não há mais sonhos que se anseie realizar,
Apenas vívidos pesadelos de uma amarga realidade
Que fará morada na eternidade.
E só o que restará serão perguntas sem respostas ;
Caminhos sem volta ;
Dores sem remédio ;
Um vazio cujo propósito jamais fará sentido.