Zaira Belintani

O Lado Sombrio do Ser

 

Brincando, pisei de leve o chão molhado

Dentro da tarde morna que morria

Saída do interior de um longo dia

Que se sentira envelhecido e só.

 

Sorrindo. Dentro da tarde calma

A luz brincava de abrir passagem

Através do verde-negro da folhagem,

Indo pousar nas pedras mudas da calçada.

 

Um dia escondendo-se na noite.

Vozes, sussurros, lamentos, canções

E os sons se confundindo ao traduzir as vibrações

De pessoas e de coisas mergulhadas no torpor.

 

Súbito! Pisei na tarde calma e distraída!

Senti sob meus pés raios finais

De derradeiro sol que não vi mais

E todo o espaço envolveu-se em densas nuvens.

 

Então o que era dia anoiteceu

E Tudo que era noite chorou de medo!

Calaram-se os lamentos e os folguedos

E um repousar febril permaneceu.

 

Chorava e gotejava a chuva fria

Atravessando a vastidão do espaço eterno

Que abrigara em seu seio terno

Restos do que sobrara de uma vida inteira.

 

Dentro daquela noite eu me procurei.

Eu era só eu, com meus pensamentos.

Eu era só eu, com meus argumentos

E eu era só…


Arquivo 1981

Imagem: Rua do Rosário, Itabirito MG / Zaira Belintani