Luis Sátiro

DA PAISAGEM MILIMÉTRICA

Primeiro, na escuridão de uma luz apagada

e no murmurar de um pesadelo;

e segue no latido dos cães que delatam um passante

de cheiro desconhecido;

numa noite que segue calma em contraste com

a paisagem milimétrica...

pela rua que segue paralela ao ribeiro urbanizado

que desce o esgoto que vai para o rio;

o mesmo rio sazonal que para uma vez por ano,

para servir de maternidade para aguapés

e de cemitério para peixes.

 

No jovem que desce de skate a praça plana

seguido por policiais;

no jovem que não sabe ser o que quer ser quando crescer;

no horror de se ter emprego e não ter tempo

para fazer o que quer;

na angústia de se ter tempo e não ter emprego

e, por isso, não ter dinheiro para comprar

o que quer e o que precisa;

na rua que tira nova identidade após ser assaltada;

da moça que desce a rua assaltada e recebe

assustada as cantadas sem decoro de uma

moçada de olhos famintos.

 

No entardecer de milésimos torrenciais

onde os olhos comem as cores aquecidas

pelos últimos raios que descem feito cascata vibrante

em contraste com a fumaça de lixo sendo queimado;

 

das reticências que expressam a infinitude espiralada

de que é formada a paisagem milimétrica.