Quem és?
Por que te escondes
Na noite escura?
Do que foges espavorido
Vil criatura?!
Não respondes?
Tu sombra te morde nos pés!
O que procuras esconder, criatura,
Em teus devaneios perdido,
Fugindo do próprio vulto,
Que astuto
Segue-te, e te tens querido
Inclemente alcançar,
Na tua noite infinda de amargura?
Responde o vento em reclamo:
Esse ser de pétreo coração ,
Vate querido,
Que de monstro chamo,
Procura o sonho de ventura,
Alentado delírios,
Em louca ilusão!
Nem se dá conta o insano,
Dos crimes cometidos!...
Tempo perdido
Em farras e prazeres mundanos,
Que um dia, inexoravelmente ,
Na poeira do tempo acaba!
Aos isensatos, o reverteres, a paga!
Ele, amigo vento errante,
Não sente o pesadelo cortante,
Atormentando-lhe a alma,
Tirando-lhe a calma?
O remorso não há
De lentamente matar
Esse ser desprovido de alma?!
Cobrando-lhe
Pelo malfeito perpetrado?
E que ainda se gaba
Tê-lo cometido?
Ao qual, a consciência
Lhe tem arremetido,
Cobrando-lhe a traição a um amigo?!
O vento esbraveja em resposta,
Farfalhando em minha porta:
-- Nobre poeta, não vê,
Na perversa criatura,
Estampada na cara,
A sentença que exara
No véu da amargura -- culpado?!
A sombra que emerge dele insiste,
E persiste, em fustiga-lo!...
O castiga no coração
E na alma,
Denuncia, desse ser das brumas,
O crime mesquinho de traição --
Aponta o dedo em riste !
-- Ele é o ser da senda mais triste,
Dentre seres impudentes,
Que na face da terra existe:
Uma criatura execrável,
Um miserável
Cuja maldade,
Nem sombra de remorso sente.
-- Quem és, criatura?
Do que foges espavorido?
O que esconder tens querido
Na noite escura?
Não escutas o eco
Da tua consciência
Que, implacável te acusas?!
Pontua a brisa: -- Amiga Lua,
Esse por quem perguntas, traz consigo,
Um requinte de maldade :
Um punhal cravaste
No peito , na alma , do melhor amigo.
É um ser mísero que mataste
Cruelmente o amor, a amizade!