Victor Severo

Escravidão.

Arrastados pela força de impiedosos ditames.

Sem amparo, sem guarida, a não ser da esperança.

A fugir inutilmente da bandeira dos infames.

Na embriaguez que já não embala nossa dança.

Já não sei se vale a pena tal reclame.

Olhando para os lados, assustados feitos crianças.

Sozinho estamos, ninguém mais escuta o conclame.

Só resiste a miséria onde nunca houve pujança.

 

Escravizados pelos nobres brancos macacos.

Fitando o céu carmesim invadido pela peste.

Crianças morrem, lábios pálidos, olhos opacos.

Anjos encardidos, sementes do vasto agreste.

Mulheres e homens como eu tombam em cacos.

Amofinados, cansados, mortos vivos, sempre inertes.

Aprisionados, agrilhoados em miseráveis barracos.

Dormimos pedindo, clamando que a morte nos liberte.

 

Submetidos eternamente a humilhante caridade.

Que sempre nos rouba o tudo para migalhas devolver.

E exige que o escravo se porte com humildade.

Para que o ciclo se repita, em odioso proceder.

Exigem que nos portemos com servil sobriedade.

Pois nossa propriedade resume-se a sobreviver.

Assim vão nos impingindo suas tolas veleidades.

Até que a morte os carregue e no fogo os faça arder.

 

E quanto mais passa o tempo, mas perde força o lamento.

Carcomidos pela traça de nossa própria desgraça.

Quanto mais o tempo encurta, mais aumenta o sofrimento.

O agourento pavor que a toda dor ultrapassa.

O pestilento odor que mapeia o firmamento.

O desprezível clamor que se perde qual fumaça.

Alguém finge escutar, nada além de fingimento.

Em breve estarás sozinho, tu e tua dor, podre carcaça.